O pedido de honorários de sucumbência deve ser computado no valor da causa?

Aspectos Processuais da Reforma Trabalhista

ASPECTOS PROCESSUAIS DA REFORMA TRABALHISTA: O pedido de honorários de sucumbência deve ser computado no valor da causa?

 

 

 

Fabrício Lima Silva¹

Rafael Leme Macedo²

 

 

  1. Introdução

O art. 840, §1º, da CLT, com redação dada pela Lei 13.467/17 passou a prever, como regra geral, a necessidade de indicação do valor do pedido, seguindo o que já era previsto para o rito sumaríssimo (art. 852-B, I, da CLT).

Partindo da compreensão de que honorários advocatícios são pedidos, ainda que implícitos, muitos operadores do direito se questionam se os honorários de sucumbência devem ter seu valor indicado na inicial, compondo o valor da causa.

Embora tenhamos entendimento de que seja desnecessária a indicação do valor pertinente aos honorários, por meio do presente artigo, pretendemos analisar o instituto do valor da causa, de modo a compreender sua função dentro da sistemática processual, analisando quais valores deverão compor sua base de cálculo, a fim de concluir se esta deveria computar os honorários sucumbenciais.

 

  1. Pedidos implícitos

Como regra, os pedidos formulados na inicial devem ser expressos (art. 322, caput, do CPC) e determinados em relação a sua qualidade e quantidade, sendo lícito, em algumas ocasiões formular-se pedido genérico (art. 324, caput, do CPC).

O pedido implícito, por sua vez, conforme esclarece Fredie Didier Jr.: “é aquele que, embora não explicitado no instrumento da postulação, compõe o objeto litigioso do processo (mérito) em razão de determinação legal. Mesmo que a parte não peça, deve o magistrado examiná-lo e decidi-lo”[1]. Logo, o pedido implícito contrapõe-se ao pedido expresso.

Para Marinoni, Arenhart e Mitidiero:

Nada obstante a regra seja a necessidade de pedido certo, ainda que não pedidos expressamente, os juros legais, a correção monetária e as verbas de sucumbência, inclusive honorários de advogado, consideram-se implicitamente pedidos pela parte (art. 322, §1º, CPC).[2]

Da mesma forma, Fredie Didier Jr. coloca os honorários advocatícios como uma das hipóteses de pedido implícito, ao lado dos juros legais, do ressarcimento de despesas processuais, da correção monetária e das parcelas vincendas, quando se tratar de obrigação com prestações periódicas[3].

Apesar de não haver regra expressa nos Códigos anteriores o art. 322, §1º, do CPC/15 passou a dispor expressamente que: “compreendem-se no principal os juros legais, a correção monetária e as verbas de sucumbência, inclusive os honorários advocatícios”. No CPC/73, somente havia disposição expressa quanto aos juros legais (art. 293).

Mas mesmo antes da regra expressa a jurisprudência já considerava os honorários advocatícios pedidos implícitos, conforme Súmula 256 do STF, editada na vigência do CPC/39: “É dispensável pedido expresso para condenação do réu em honorários, com fundamento nos arts. 63 ou 64 do Código de Processo Civil”.

E na vigência do CPC/73, o Superior Tribunal de Justiça julgava no mesmo sentido, conforme julgado trazido abaixo:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC/73. INEXISTÊNCIA. RAZÕES DO AGRAVO QUE NÃO IMPUGNAM, ESPECIFICAMENTE, A DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA 182/STJ. SENTENÇA QUE SE OMITIU, QUANTO À FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. FIXAÇÃO, PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. POSSIBILIDADE. EFEITO DEVOLUTIVO DA APELAÇÃO, QUE PERMITE O CONHECIMENTO DE MATÉRIAS EXAMINÁVEIS DE OFÍCIO. FALTA DE IMPUGNAÇÃO, NO RECURSO ESPECIAL, DE FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO COMBATIDO, SUFICIENTE PARA A SUA MANUTENÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 283/STF. AGRAVO INTERNO PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NESSA PARTE, IMPROVIDO. (…) V. Na forma da jurisprudência desta Corte, ‘a fixação dos honorários advocatícios é matéria que deve ser conhecida de ofício, porquanto é consectário lógico da sucumbência‘ (AgRg no REsp 1.189.999/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/8/2012, DJe de 24/8/2012)’ (STJ, AgRg no AgRg no REsp 1471484/MG, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, DJe de 09/11/2015). Nesse contexto, considerando o efeito devolutivo da Apelação, que possibilita o conhecimento, pelo Tribunal de origem, de matérias examináveis de ofício – como é o caso dos honorários advocatícios -, não há que se falar em preclusão ou em ilegalidade do acórdão que, em razão da omissão da sentença, arbitrou honorários advocatícios, em desfavor da parte sucumbente na demanda. Precedentes do STJ. (AgInt no AgInt no AREsp 1.036.285/PE, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/10/2017, DJe 27/10/2017) – destacamos.

Neste mesmo sentido, também na vigência do CPC/73, há inúmeros julgados do TST, a exemplo:

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PEDIDO IMPLÍCITO. Cuidando-se os honorários advocatícios de pedido implícito, segundo doutrina e jurisprudência assentes, mostra-se irrelevante o fato de a parte apenas ter reprisado o pedido formulado na inicial, sem tecer qualquer argumento. Assim, estando presentes os requisitos descritos nas Súmulas 219 e 329 do TST, mostra-se devida a verba honorária. Recurso de revista não conhecido. 6. HONORÁRIOS PERICIAIS. Sendo o Reclamado sucumbente na pretensão objeto da perícia, deve arcar com os honorários periciais, nos termos do art. 790-B da CLT. Recurso de revista não conhecido (RR-167300-62.2007.5.02.0033, 7ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 24/04/2015).

RECURSO DE EMBARGOS DO SINDICATO DOS TRABALHADORES DO RAMO QUÍMICO E PETROLEIRO DO ESTADO BAHIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUSÊNCIA DE PRETENSÃO RECURSAL ACERCA DA PARCELA. SINDICATO. SUBSTITUTO PROCESSUAL. PEDIDO IMPLÍCITO. DEFERIMENTO EM FACE DA MERA SUCUMBÊNCIA. No caso de que se trata o sindicato embargante, como substituto processual, quer a condenação em honorários advocatícios, amparado que está por força do item III da Súmula 219 do c. TST. Não resta dúvida de que a pretensão decorre da sucumbência e não da assistência judiciária. Pedido implícito. O êxito na demanda se deu, pela primeira vez, no provimento do recurso de revista pela c. Turma desta Corte. Vale dizer, naquele momento, tornou-se vencedor! Vencedor, e não mais vencido, teve por reversão a condenação da parte agora vencida nas custas processuais, diante da implicitude do tema. Houve reversão, a determinar a condenação nos honorários advocatícios, por mera sucumbência. Recurso de embargos conhecido e provido (E-ED-ED-RR-27301-72.2005.5.05.0133, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, DEJT 09/11/2012).

RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 460 DO CPC. INEXISTÊNCIA. NÃO PROVIMENTO. (…) Primeiramente, afigura-se irrelevante o fato de a parte ré não ter postulado em defesa a condenação do autor em honorários advocatícios. Trata-se de pedido implícito, de modo que, mesmo não explicitado na demanda, compõe o mérito da controvérsia por força de lei, cabendo ao magistrado examiná-lo e decidi-lo, a despeito da ausência de formulação pela parte. Infundada, portanto, a alegação de afronta ao artigo 460 do CPC. (…) (RO-893-68.2010.5.09.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, DEJT 13/04/2012).

Dessa forma, é possível estabelecer com relativa tranquilidade que os honorários sucumbenciais possuem a natureza de pedido implícito, motivo pelo qual defendemos ser desnecessária a formulação de pedido expresso.

– Mas, se apresentado o valor na petição inicial ou se formulado de forma implícita, tal montante deve ser computado para definição do valor da causa?

 

  1. Critérios para definição do valor da causa

Marinoni, Arenhart e Mitidiero conceituam valor da causa como: “a expressão econômica do pedido, devidamente dimensionado à luz da causa de pedir.”[4]

Semelhante é o conceito atribuído por Araken de Assis, para quem: “O bem da vida, proveito, vantagem, benefício ou utilidade (pedido imediato) tem valor econômico. O autor indicará na petição inicial o valor da causa ou quantia em dinheiro que expressa semelhante conteúdo.”[5]

O art. 292, VI, do CPC estabelece que “na ação em que há cumulação de pedidos, a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles”.

Em uma leitura inicial, concluiríamos que devem ser somados os valores dos pedidos expressos e implícitos, já que a norma não faz distinção quanto a esses.

Por outro lado, o artigo 292, I, do CPC aponta que: “na ação de cobrança de dívida, a soma monetariamente corrigida do principal, dos juros de mora vencidos e de outras penalidades, se houver, até a data de propositura da ação”. (destaquei)

Da leitura a contrario sensu do dispositivo, podemos inferir que os juros e correção monetária devidos após a propositura da ação não devem ser computados para atribuição do valor da causa. E tal se dá porque o valor da causa não pode ser eventual, devendo representar o conteúdo econômico equivalente à relação jurídica que se postula reconhecimento quando do ajuizamento da ação.

Não é possível estabelecer, a princípio, qual será o valor total devido a título de correção monetária e juros após o ajuizamento da ação, já que este montante depende do tempo de andamento do processo e do comportamento das partes, em especial da ré, de satisfazer a obrigação.

Da mesma forma sucede quanto aos honorários de sucumbência, já que não sabemos qual o percentual será definido pelo juiz, que pode variar entre 5% a 15%, a partir da análise dos critérios do art. 792-A, §2º, da CLT: “I – o grau de zelo do profissional; II – o lugar de prestação do serviço; III – a natureza e a importância da causa; IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço”.

Como o trabalho do advogado deve ser analisado ao longo do processo, não é possível se estabelecer, a priori, a partir do ajuizamento da ação, o valor final que lhe será conferido, ainda que todos os pedidos sejam julgados procedentes, pois tal montante depende da análise de fatos supervenientes, a serem ponderados pelo magistrado quando da prolação da sentença[6].

Acrescenta-se que, tanto nas prestações alimentícias (inc. III) quanto nas obrigações de pagamento por prazo indeterminado ou superior a um ano (§2º) o valor da causa máximo corresponderá ao equivalente a 12 parcelas (um ano), ainda que as parcelas ao final devidas sejam superiores a esta quantidade.

Assim, é forçoso concluir que nem sempre o valor da causa corresponderá à soma real dos valores dos bens materiais obtidos em juízo, correspondendo a uma estimativa que atende a diversas finalidades, como: a) requisito de admissibilidade de recursos, já que o cabimento do recurso de revista difere quando se trata de demanda submetida ao rito ordinário, sumaríssimo ou de alçada; b) cálculo das taxas judiciais, caso devam ser pagas, ao final, pelo autor da demanda (art. 789, II, da CLT); c) base de cálculo para sanções processuais, a exemplo das multas por litigância de má-fé e por oposição de embargos de declaração protelatórios.

Ademais, ao se utilizar a expressão “compreendem-se no principal” na redação do art. 322, §1º do CPC, podemos depreender que o valor dos pedidos implícitos não precisa ser apontado de forma autônoma para apuração do valor da causa, pois já estariam incluídos, de forma fictícia, no montante do principal.

 

  1. Análise sob as óticas da natureza do pedido implícito, da isonomia processual e da impossibilidade de cálculo sobre verbas de mesma natureza

A questão também possui um viés de ordem prática: se o juiz pode até mesmo julgar tal pedido sem que haja indicação expressa, não faz sentido que, havendo sua indicação, mas não a do valor correspondente, haja a extinção do processo sem resolução do mérito, em razão da inépcia[7].

Sob o ponto de vista de isonomia processual, como os honorários de sucumbência podem ser devidos tanto pelo autor, quanto pelo réu, a contestação já conteria, implicitamente, uma reconvenção, formulando-se o pedido de pagamento de honorários ao autor.

E adotando-se a tese contrária, de necessidade de indicação do valor do pedido, tratando-se de nova ação, o réu-reconvinte também deveria ter apresentado um valor à causa, representada unicamente pelos honorários sucumbenciais eventualmente devidos.

E mesmo na vigência do CPC/73, quando ainda era necessária a apresentação de peça autônoma para a reconvenção (art. 299), autores de demanda eram condenados ao pagamento de honorários de sucumbência, sem sequer se ventilar acerca da necessidade do protocolo da reconvenção e, consequentemente, da indicação do seu valor da causa.

Na verdade, mesmo que a parte ré fosse revel, ainda sim o autor poderia ser condenado ao pagamento de honorários sucumbenciais, seja porque não comprovou os fatos que lhe incumbia, nas hipóteses em que a revelia não produz a presunção de veracidade dos fatos da inicial (art. 844, §4º, da CLT), seja porque a tese jurídica apresentada não foi acolhida.

Por fim, cumpre destacar que a inclusão dos honorários advocatícios no valor da causa representaria a incidência de verbas de mesma natureza uma sobre a outra, já que os honorários advocatícios devidos seriam calculados sobre honorários advocatícios postulados:

1) no caso de improcedência da demanda, haveria cálculo de honorários do réu em cima dos honorários postulados pelo autor, que são apurados sobre o valor atualizado da causa (art. 791-A, caput, parte final, da CLT);

2) no caso de procedência total dos pedidos, como os honorários devem ser apurados sobre “o valor que resultar da liquidação da sentença”, o valor dos honorários também deveria incluir os honorários, representando um looping infinito, sem solução.

Afastando-se a problemática do item 2 pela incidência de honorários apenas sobre o valor da condenação sem os honorários, certamente se estaria violando a isonomia, já que os honorários devidos ao patrono do réu seriam calculados com a incidência dos honorários postulados pelo autor.

Assim, a única maneira de calcular o valor de maneira justa, sem que se viole a isonomia, é que na quantificação do valor da causa não sejam incluídos os honorários sucumbenciais postulados (ainda que implicitamente) pelas partes.

 

  1. Conclusão

Conforme exposto acima, é praticamente unânime, tanto na doutrina como na jurisprudência, que os honorários sucumbenciais possuem a natureza de pedido implícito.

Embora o art. 292, VI, do CPC estabeleça que o valor da causa deve corresponder à soma do valor dos pedidos, entendemos que os honorários sucumbenciais não devem ser computados para definição de seu valor.

Em resumo, isso se dá porque: 1) o valor da causa nem sempre representa a soma de todos os bens materiais obtidos em juízo; 2) o valor da causa representa valores devidos até o ajuizamento da ação, enquanto os honorários dependem da análise de fatos supervenientes, para fins de fixação de seu percentual; 3) se o pedido de honorários sequer precisa ser expresso, não há lógica em se exigir a indicação de seu valor; 4) o réu não indica o valor do pedido de honorários em sua defesa, que representaria uma reconvenção quanto este pedido, violando-se a isonomia processual; 5) impossibilidade de incidência de verbas de mesma natureza uma sobre a outra, já que honorários advocatícios devidos seriam calculados sobre honorários advocatícios postulados.

1 – Fabrício Lima Silva – Juiz do Trabalho do TRT da 3a Região. Coordenador da Pós-Graduação de Direito e Compliance Trabalhista do Ieprev. 

2- Rafael Leme Macedo – Graduado pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (FDRP-USP). Ex-assistente de juiz do trabalho. Assistente de Desembargadora no TRT da 18ª Região.

[1] DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: introdução ao direito civil, parte geral e processo de conhecimento. 17ª Ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2015, p. 590.

[2] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil Comentado. 3ª Ed. rev, atual. e ampl. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2017, p. 421-422.

[3] DIDIER JR., Fredie, obra cit., p. 591.

[4] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel; obra cit., p. 381.

[5] ASSIS, Araken de. Processo Civil Brasileiro, volume III: parte especial: procedimento comum (da demanda À coisa julgada). 2ª ed. rev. E atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 80.

[6] No sentido ora trazido: SILVA, Fabrício Lima. Aspectos processuais da reforma trabalhista: A (des)necessidade de indicação do valor do pedido de honorários de sucumbência na petição inicial. Disponível em: <https://dicastrabalhistas.com.br/2019/04/25/aspectos-processuais-da-reforma-trabalhista-a-desnecessidade-de-indicacao-do-valor-do-pedido-de-honorarios-de-sucumbencia-na-peticao-inicial/> Acesso em: 14 abr. 2020.

[7] Expondo tal linha argumentativa: SILVA, Fabrício Lima, obra cit.

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